sexta-feira, 16 de novembro de 2018

Fala-lhes de Livros...

Fala-lhes de Batalhas, de Reis  e de Elefantes de Mathias Énard foi a obra literária que esteve em análise no passado dia 15 de novembro, na Biblioteca Municipal José Saramago, em Loures. A partir deste livro encheu-se uma mesa de cultura - livros, fotografias, objetos e outras coisas boas para no final da sessão podermos degustar.

Fala-lhes de Batalhas, de Reis  e de Elefantes

Construir uma ponte, não sob o estreito de Bósforo, mas entre a cultura, Miguel Ângelo, a literatura, a poesia, a pintura e a escultura. Vamos ver se a nossa ponte não é só um esboço de ponte.
Estamos perante um livro com poucas páginas, capítulos curtos, com um ritmo, que segundo o autor tem a ver com o ritmo do próprio Miguel Ângelo. Aliás o autor diz numa entrevista que o livro foi pensado como um “sketchbook” (livro de esboços), como os desenhos do próprio Miguel Ângelo. Mesmo o autor considerando-o um esboço, apresenta-nos um texto muito rico, belo e poético e é uma pérola, porque nos remete para o conhecimento, não só da vida do artista, mas para o conhecimento de um modo geral. Porque com este livro procuramos saber mais coisas. O próprio autor refere que teve de pesquisar muito para construir esta narrativa, e que demorou três anos a escrevê-lo.
A história deste livro é muito engraçada, porque o autor parte de um suposto convite do Sultão Bayzid (que reinou durante 31 anos, em Constantinopla.) e conta-nos um episódio da vida do grande artista Miguel Ângelo – a sua ida para Constantinopla (1506). ( o convite parece que existiu e ao que parece poderão existir esboços dessa ponte, mas Miguel Ângelo parece que nunca esteve em Constantinopla). João Paulo Oliveira e Costa, explicou numa sessão que existem os chamados buracos na história, entre as fontes , um hiato de tempo,  que levam os ficcionistas a usar da sua imaginação e escreverem romances do género histórico por conta disso. Este parece ser o caso.
Miguel Ângelo, teria 31 anos e já era um conceituado artista ou mesmo o maior daquele tempo, muitas vezes comparado a Leonardo Da Vinci que era 20 mais velho.
Tem uma oferta simpática de uma quantia avultada de dinheiro, por parte do Sultão e estando desavindo com o Papa Júlio II, terá aceitado. Há um pormenor que acaba por ser decisivo para ele aceitar o convite que foi o facto de Leonard Da Vinci ter sido anteriormente convidado e já ter feito um esboço para a tal ponte ser construída sobre o Corno de Ouro – uma ponte que unirá o lado ocidental do lado oriental da capital do Império Otomano. Consta que o Sultão terá rejeitado o projeto de Leonardo Da Vinci por não gostar dele esteticamente. O orgulho fala mais alto e leva Miguel Ângelo a aceitar.
Através desta obra literária também ficamos a conhecer um pouco do que era Constantinopla naquela época. Uma cidade cheia de gente de todas as crenças – os judeus, tinham sido expulsos de Portugal e também de Espanha, e os mouros haviam perdido o reino de Granada.) Portanto é uma Constantinopla de muitas línguas e culturas. Mathias Énard, é um escritor francês, premiado com o mais prestigiado prémio literário da França, o Prix Goncourt (com o livro Bússola, em 2015. Também recebeu o prémio Prix Décember, 2008 pelo seu livro Zona e por este “Fala-lhes de batalhas, de reis e de elefantes” Prix Goncourt Lycéene, 2010. Tem seis romances, mas penso que só três estão traduzidos na língua portuguesa.
 O autor viveu mais de 10 anos no Oriente, nomeadamente na Síria, na Líbia, Irão e Egito que ao todo faz mais de 10 anos. Sempre se interessou pela cultura oriental, estudou árabe e persa e é um académico especialista em literatura oriental.  É professor de árabe na Universidade de Barcelona, cidade onde vive.
É uma das vozes mais relevantes da literatura francófona. O autor já esteve em Portugal na Noite de Literatura Europeia.
Énard com este texto mostra-nos uma possibilidade de relações entre o Ocidente e o Oriente.
Com este livro chama a atenção para outras pontes, penso que metaforicamente o autor alerta para a necessidade de se estabelecerem pontes entre o ocidente e o oriente. No livro diz-se “São belas as pontes, se perdurarem”. É uma visão muito interessante.
O autor ficciona também uma relação com o poeta Mesihi (que existiu e foi um mestre da renovada poesia otomana). O poeta apaixona-se pelo escultor, que por sua vez sonha com a dançarina, vinda da Al-Andaluz (depois dos reis católicos terem destruído aquele lugar de coexistência pacífica entre muçulmanos, judeus e cristãos). São pessoas muitos diferentes do artista, mas que nos transporta para a ideia  de nos relacionarmos com o outro e aceitarmos as diferenças dos outros.
Parece haver um jogo de oposições que se desenvolve no texto.   Papa / Sultão; Cristão / muçulmano; guerra / poesia; leste / oeste; homossexualidade / heterossexualidade. De fato, a construção dessa ponte aparece na história como a solução.
É um livro brilhante que desafia o mito, a imaginação e a fantasia. O autor faz-nos entrar na mente de um génio, que é um turbilhão de ideias e que contribuiu um mundo mais belo, porque podemos ainda hoje apreciar as suas esculturas e pinturas. Através deste livro poderemos fazer uma viagem pela arte e por isso este livro está recomendado no PNL para jovens para motivar ao conhecimento das obras de arte espalhadas por Itália (sobretudo Florença e Roma).
                                Pietá de Miguel Ângelo


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