domingo, 26 de agosto de 2018

A extinção do Português



Há tempos tive a visão clara da extinção do Português. Um grupo de brasileiros, provavelmente recém-chegado, tentava fazer-se compreender num restaurante de Lisboa. E entender o empregado. Um deles acabou por exclamar: — Não entendi porra nenhuma!
Estará o Português em perigo? A incomunicabilidade entre versões de uma língua é um forte sinal de alarme. Uma língua tem um comportamento semelhante a uma espécie viva: evolui a partir de uma antepassada, ganha massa crítica de indivíduos, autonomiza-se, cria rebentos semelhantes, pode expandir-se, pode ficar isolada, definhar e morrer.
Hoje, existem cerca de seis mil línguas, fora os dialetos, mas todos os anos desaparecem dez, em média. Com elas perdem-se os tesouros culturais que veiculavam. E, tal como as espécies, uma língua, uma vez extinta, não reaparece mais. O limite da sobrevivência situa-se por volta dos cem mil falantes. Na história humana terão já desaparecido mais de vinte mil línguas. Algumas, pelo contrário, sobrevivem há mais de dois mil anos. O segredo do sucesso parece ser o grande número de falantes. Como o número de indivíduos nas espécies, o número de indivíduos que usa uma língua assegura-lhe a continuidade.
Neste ponto, o Português, com os seus 250 milhões de falantes, tem boas condições de sobrevivência e até de expansão. Só o Brasil tem quase 210 milhões. Outros milhões são falantes em grandes países africanos com excelente potencial de crescimento. É uma das nove línguas que, só elas, congregam metade da população mundial. É como uma espécie endémica; o seu êxito é inquestionável. Evoluiu do latim, a partir do regionalismo galaico-duriense, e conseguiu constituir-se como língua autónoma, apesar do convívio contagioso com o castelhano. Mas estes 250 milhões ainda falam uma só língua?